Poema do Peiote – Parte 1, de Michael McClure

Poema do Peiote – Parte 1

Michael McClure (n.1932, EUA)

Trad. Diego Callazans


Livre – sentidos claros – sentado na cadeira preta – De balanço –
               paredes brancas refletindo a cor de nuvens
                    movendo sobre o sol. Intimidades! Os quartos
     sem importância — mas como divisões de todo espaço
               de toda hediondez e graça. Eu ouço
                     a música de mim e a anoto
           sem esperar leitor. Eu passo fantasias como
                Me são cantadas em Vozes-de-Circe. Eu vago
      entre os povos de mim mesmo e sei de tudo
                                Que preciso saber.
     EU SEI DE TUDO! EU PASSO PARA O QUARTO

           uma cama dourada se põe a radiar a luz inteira
     o ar enche de linhas e borrões de prata.
                               Eu rio pra mim mesmo. Sei de tudo
             que há para saber. Eu vejo tudo que há
                para sentir. Fiz as pazes com a dor
                          na minha barriga. A resposta
                pro amor é minha voz. O tempo não existe!
     Nem resposta nenhuma. Ao sentimento, meu sentir é a resposta.

                À alegria, resposta é alegria sem sentir.

                O quarto é um querubim de muitas cores
     feito de ar e reluzentes tons. A dor no meu estômago
           é quente e terna. Estou sorrindo. A dor
                em mil pontadas, sem angústia.
           A luz altera o quarto de amarelo a roxo!
     O espaço amarronzado atrás da porta é o ouro
           íntimo, silencioso e calmo. Terra natal
                de Brahms. Sei tudo
           que é preciso que eu saiba. Não há pressa.
     Eu leio os sensos dos muros riscados, tetos pensos.
           Estou à parte. Os olhos fecho em divindade e dor.
           Solenemente eu pisco à insolente alegria.
                Sorrio pra mim mesmo em movimentos. Andando
                     apresso o passo com cuidado. Preencho
           o espaço com meu ser. Eu sei o segredo e os distintos
                traços da fumaça que vem de minha boca.
           Eu sou, sem atenção, parte de tudo. À parte
     estou do que é triste e belo. Eu sei de tudo.
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                          (VASTIDÃO

     E dura intensidade — dentro de mim. Não mais
                                    uma nuvem
           mas carnal feito pedra. Como Herácles
                          de primevos vigor e substância.
           Não temendo sequer o fim do encanto
                          mas aceitando.
     As coisas belas não são pra nós,
                mas miro. Estando entre elas.
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                          E a coisa indígena. É à vera!
           Aqui no apê é mais tribal minha mente.)
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                          ESTÔMAGO!!!
     O tempo não existe. Eis que visita um cara
                que é deus das raposas
           traz sujeira nas unhas de sua pata
                         recente do covil.
           Sorrimos um ao outro em reconhecimento.

           Estou livre do tempo. Aceito sem triunfo

                          — um fato.

           Se fecho os olhos há clarões de luz.

     Meus olhos já não focam, saltam. Eu vejo que tenho três pés.
                Eu vi de uma só vez sete lugares!
           Inclina o assoalho – o quarto oblíqua
                          coisas derretem
             dentro de outras coisas. Clarões
                de luz
           e fusões. Eu espero
     olhando a coisa física passar.
                Estou numa mesa de tempo e espaço.
                          ! ES-TÔMA-GO!
                Escrevendo a música da vida
                     em versos.
                Ouvindo os bons sons da guitarra
                     em cores.
                Sentindo a carne a me tocar.
                Enxergo o caos liberto das palavras
                na página.
                     (suprema graça)
           (O doce Yeats de esferais haxixes.)
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           Minha barriga e eu somos dois caras
                unidos pela
                     vida.
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           ESTE É O PODEROSO CONHECIMENTO
                sorrimos com ele.
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           Da janela eu olho pra melancolia azul-cinzenta
                da lugubridade.
     Tô aquecido. No dragão do espaço.
           Eu fito as nuvens vendo
                suas convoluções brumosas.


                Os turbilhões do vapor
     Pequenarei as nuvens 'té que sumam.
     Elas se tornam peixe e comem uma à outra.
     E mudam como espíritos de Dante
     a se tornar no céu mais alto imóvel garça
                pra me desafiar.

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