Ouvindo Michael Jackson em Teerã, de Ali Alizadeh

Ouvindo Michael Jackson em Teerã

Ali Alizadeh
Trad. Diego Callazans

a partir de um tema de Azar Nafisi

Vindo na muamba do feroz abismo
que nos lacra do Tio Sam, e então

socado na muvuca entre meus livros
de Persa e de Ciência na mochila do

colégio, uma fita K7 de Thriller,
ilegal, sacrílega, pronta pra ser

revelada àquelas ovelhinhas tolas
no ônibus da minha escola primária

na Teerã em guerra. Meu plano:
expor o objeto proibido, exibir

minha coragem, rebeldia, etc. Outono
de 83, desesperado por que olhassem

e me amassem os guris. Minha cópia 
da perigosa 'arte' ocidental abalaria

o tedioso mundinho islâmico
dos meus colegas – e elevaria

minha covarde, gorda e impopular
figura. Sussurrei pro menino ao lado

se ouvira falar, acaso, de “Billie Jean” e
Beat It”; se sabia o que quer que fosse

sobre a famosa estrela número um
de nosso amargo inimigo, “Eu amo

Thriller! Não acha assustadores os zumbis
naquele clipe! São tão horrendos!” Suas

frases, estridentes, ecoavam. O ônibus
todo vibrou com aquele nome. Alguém

gritou que tinha um pôster de Thriller, e um
outro, camiseta “Billie Jean”, trazida da

Turquia. Calei, roubado de meu tão urdido
estrelato, afundei na cadeira; depois joguei

fora minha fita, o fetiche da inútil e
ubíqua cultura pop do Grande Satã.

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