sobre "A poesia agora é o que me resta"

Meu primeiro livro foi lançado em 2013. [Parei de falar "livro de poemas" porque todos os meus livros e provavelmente sempre serão "de poemas".] Saiu pela Editora Patuá por graça e obra de Eduardo Lacerda, meu primeiro editor, sempre muito gentil e amigável. O lançamento oficial foi na minha cidade, pra menos de meia dúzia de amigos. Mas houve um lançamento não-oficial em São Paulo, num barzinho, em que o Eduardo me apresentou a diversos autores do cenário paulistano. Foi uma grande experiência, que tem repercussões inesperadas até hoje, como um escritor me dizer que já me conhecia de nome por eu ser citado por pessoas do movimento maloqueirista - algo que eu não sabia. "A poesia agora é o que me resta" me rendeu e ainda me rende bons contatos.

Quando eu reuni os poemas do livro, meu objetivo foi montar uma obra coesa a partir de poemas escritos em épocas distintas, com estilos e sentidos distintos. Recentemente eu reli o livro e notei que alguns de seus poemas talvez não devessem e estar lá, ao passo que poemas que guardei pra publicação futura, como vários dos que saíram em Nódoa, deveriam ter sido publicados no primeiro livro. Sinto que o livro seria mais forte dessa forma. Paciência. No futuro talvez eu lance uma coletânea só com meus poemas preferidos e reúna poemas que foram escritos na mesma época e têm sentidos próximos, mas que saíram em livros diferentes. Ainda hoje tenho vários poemas escritos há um bom tempo que aguardam sua vez de sair em livro. Meu propósito para o terceiro livro é justamente fechar meu arquivo publicando todos os poemas publicáveis, mas ainda não publicados, para ficar livre deles [eis o grande objetivo de publicar poemas: livrar-se deles] e poder me focar em livros mais fechados, com temática clara e abertos a experimentações coerentes.

Um ponto de que me orgulho bastante é que o prefácio de meu primeiro livro foi escrito pelo Eduardo Sterzi, um dos críticos mais importantes do país. Seu prefácio, também publicado na revista Sopro, é o primeiro esforço de compreensão sistemática de meus poemas e sou muito grato a ele por me apresentar considerações interessantes, que enriqueceram meu trabalho e me ajudaram a definir no que investir e o que abandonar. O resultado ficou tão bom que ele decidiu publicar o prefácio pouco antes do livro sair, na revista Sopro, editada pela Cultura e Barbárie. O texto foi publicado na íntegra. Para ler, basta clicar aqui. Se "Nódoa" tem menos pontas soltas que "A poesia agora é o que me resta", é por conta da análise de leitores excepcionais, como o Sterzi.

Meu primeiro livro traz alguns dos poemas que mais me orgulho de ter escrito. Particularmente o primeiro, que reproduzo logo abaixo, seguido de alguns outros, como amostra.



não sou senhor sequer
do corpo que me veste

nem minha sombra
me reconhece

o nome a que me ataram
– largo – pesa

meu passo – leve
– nem rastro deixa

meus versos queime
– não há quem tome

ideias… dei-as
– me atrasavam

possuo nem mesmo a ave
que em meu inverno lateja
  
***


Orfeu, não chore mais;
não vê que é inútil?
às moiras nada compadece.

os cantos ao silêncio marcham.
as palavras morrem.
os deuses esquecem.

nas flores o sublime é breve.
a criança encurva.
desafina a lira.
o amor é pó.

a voz mais bela dura só um sopro.

às moiras nada compadece,
Orfeu; não chore.

ainda sopram versos.
a arte é viva para além dos ossos.
os deuses recordam.

há palavras que claudicam,
mas distante é a noite
e o sol, se lhe calhar, não vem depois.

cantemos.
às moiras nada compadece.
não há por que ter pressa de silêncio.
  
***
  
jamais te iludas:
a paz é breve.

tolera o verme
somente o quanto
adia a luta.

todo tratado
é uma cilada.

ausculta à lupa
atrás dos sinos.
não dês desculpa
para explodir-nos.

se for preciso,
a mão lhe estende.
force um sorriso.

com vela rente,
indaga o vento.

mantém a adaga,
oculta o intento.
nossa voz curta
assim prescreve.

jamais te iludas:
a paz é breve.

***

Vocês podem ler mais alguns poemas do livro na página da Mallarmargens. O livro traz 37 poemas; todos sem título. Quem se interessar pode adquiri-lo no site da PatuáCusta só 30 dilmas. 

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